Acção dos sindicatos é fulcral na construção da identidade profissional docente

No Seminário que teve lugar no Porto, no dia 4 de Dezembro, Abel Macedo, coordenador do SPN, na sua intervenção, chamou a atenção para o facto de, historicamente, corresponder aos sindicatos o papel de pugnar por uma identidade profissional docente dignificada, social­mente valorizada e indispensável à assunção de uma escola pensada para a vida democrática.

Referindo-se a sindicatos de uma forma geral, pormenorizou que este entendimento estava pensado para os representados na FENPROF, e particularmente para o Sindicato dos Profes­sores do Norte, lembrando o surgimento do movimento sindical logo após o 25 de Abril de 1974, cuja génese esteve na actuação dos Grupos de Estudo dos Professores dos Ensinos Preparatório e Secundário durante os últimos anos do fascismo e das preocupações já então evidenciadas com matérias como a formação de professores, o estatuto de carreira, o associa­tivismo docente, entre outras, traduzindo assim um espectro amplo de áreas de intervenção que seriam do interesse dos professores e da sua inserção na vida das escolas e do próprio sistema educativo. Justificou ainda uma relação directa entre a afirmação de uma identidade profissional forte e a pujança de uma intervenção sindical colocada ao seu serviço. Finalmente, recusando o elitismo e o corporativismo que ainda têm alguns (poucos) defensores no seio da classe docente, apontados a outro tipo de soluções, sustentou, citando António Nóvoa, que “uma ética profissional se constrói em diálogo com os outros colegas”, e que esses espaços de diálogo são defendidos, desde sempre, pelos sindicatos que assumem esta visão aberta de entender a profissão.

Antes desta intervenção, já Paulo Sucena, ex-secretário-geral da Fenprof, tinha equacionado uma questão de enorme actualidade, chamando-lhe “ A escola de hoje e a identidade profissional dos professores”, para dar conta que a subordinação da educação a uma lógica mercantil prefigura um caminho em sentido contrário ao da valorização profissional dos docentes, afasta os professores de uma concepção de profissionais autónomos e reflexivos para um contexto de subordinação quase cega a orientações e ditames que são introduzidos de fora para dentro, unicamente sujeitos a uma “autoridade” sem outra legitimidade que não seja a do poder discricionário, estranho à realidade escolar, tão estúpido quanto castrador de todas as iniciativas que “apenas” assentem em preocupações pedagógicas.

Apresentando dados recentes que evidenciam a enorme incoerência do poder central quando projecta objectivos de alargamento do número de alunos em escolaridade obrigatória a par de cortes impensá­veis em todas as dotações orçamentais referentes ao funcionamento do nosso sistema escolar, demonstrando também desta maneira, que o caminho da funcionarização, do controlo absurdo dos desempenhos profissionais docentes, da menorização da sua imagem social, está claramente assumido pelo governo que temos e que urge combater com ur­gência, sob pena de todos virmos a assistir ao definhamento de uma profissão absolutamente essencial à construção do nosso futuro colectivo. A este propósito, e citando Karl Popper na parte final da sua intervenção, “o presente nunca é um empurrão, mas um apelo do futuro”, concluiu de uma maneira que sintetiza exemplarmente o que há para fazer, e que, para os sindicatos da FENPROF, há que fazer com urgência: “os professores e as professoras têm um trabalho árduo pela frente na construção da sua identidade profissional e de uma escola democrática e de grande qualidade que deixe, como até agora, de lhes estreitar as suas margens de liberdade e de independência. E vão fazer esse trabalho com toda a esperança, porque ela só morre em quem se derrota a si próprio. Mas os docentes não são desses. São os ban­deirantes do futuro e o futuro tem o tamanho e a cor das mãos dos professores e das professoras. Mãos tecedeiras de um futuro profissional melhor e de uma escola pública que contribua para uma sociedade de homens e mulheres livres, cultos, críticos, participativos e solidários. É esse futuro que todos nós temos de nos prometer, porque nós habitamos o mundo, e o mundo é a nossa tarefa.

Quanto a Manuela Esteves, docente da Fac. Psicologia e Ciências da Educação de Lisboa e também dirigente do SPGL, começou por salientar que “a identidade profissional não é estática, mas uma construção histórica” e que “a força iden­titária”, variável segundo contextos histórico-sociais, assenta no estado de seis aspectos da mesma: orientação, voca­ção, formação especializada, autonomia, deontologia e organização colectiva”. Prosseguiu depois com a clarificação de alguns destes aspectos, como a orientação – o tipo de relação com os destinatários directos (alunos) –, a vocação – a motivação intrínseca para o exercício da profissão –, a deontologia, que tem que ser construída e não recebida de fora, e a organização colectiva, em que destacou a importância da Fenprof e dos seus sindicatos, apesar da pulverização sin­dical existente. A docente distinguiu ainda, no que respeita à identidade profissional, entre a imagem do interior e a do exterior, referindo que é inegável que é muito boa a imagem que a população em geral tem dos professores, algo que também é fruto da acção dos sindicatos. Aliás, vários estudos permitem constatar que a imagem exterior é superior à que é perspectivada dentro da própria classe. Mas destacou também a importância da acção colectiva para a construção da imagem do interior, designadamente dos vários espaços de socialização profissional, como “a equipa de trabalho docente, a escola enquanto colectivo humano, os espaços de formação e o sindicato e outras organizações profissio­nais”. Manuela Esteves terminou a sua intervenção recorrendo a uma citação de Claude Dubar: “A identidade não é mais do que o resultado simultaneamente estável e provisório, individual e colectivo, subjectivo e objectivo, biográfico e estrutural, dos diversos processos de socialização que, em conjunto, constroem os indivíduos e definem as instituições”.

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