FENPROF rejeita firmemente este anteprojecto

Sindicato dos Professores do Norte / FENPROF

A FENPROF rejeita firmemente este Anteprojecto

Parecer da FENPROF sobre o Anteprojecto de ECDU entregue pelo Governo em 27/3/2001

1. Introdução
2. O actual ECDU: Resultados da sua aplicação
3. O anteprojecto de ECDU: Críticas e soluções
3.1 Estímulos à valorização profissional e progressão na carreira
3.2 Júris dos concursos: Idoneidade e independência.
3.3 Formação pedagógica e valorização das actividades de ensino
3.4 Dedicação Exclusiva pela positiva.
3.5 Segurança de emprego e comunicabilidade entre carreiras.
4. Conclusão

1. Introdução

As carreiras constituem factores importantes, embora não os únicos, deve sublinhar-se, que concorrem para um bom desempenho dos profissionais a que se destinam, pois nelas se encontram os mecanismos destinados a facultar às instituições os trabalhadores com os níveis de qualificação e de desempenho necessários à consecução dos seus objectivos com eficiência.

Quando se pretende que os trabalhadores venham a atingir os mais elevados níveis de qualificação e de desempenho, é necessário que as carreiras sejam organizadas de modo a estimularem em cada um uma permanente procura de formação acrescida e de actualização e aperfeiçoamento profissionais, formulando exigências e criando as condições necessárias para o seu cumprimento, bem como facultando o número adequado de oportunidades de progressão salarial e de carreira, destinadas a premiar o mérito individual da contribuição de cada um para as finalidades colegial e colectivamente definidas e prosseguidas por cada instituição.

No caso das carreiras docentes do ensino superior, uma vez que se destinam a regular o exercício de uma profissão visando objectivos sociais de grande relevo que exigem o desenvolvimento e o exercício de elevadas capacidades de crítica, de criatividade, de iniciativa e de inovação, os estatutos das carreiras têm, para além disso, de garantir o mais possível as liberdades académicas, no ensino, na investigação e na extensão, incluindo a liberdade de opinião e da sua expressão pública, que assegurem a autonomia e a independência indispensáveis ao desenvolvimento de uma diversidade de abordagens e de metodologias.

Por outro lado, e pelas mesmas razões, estas carreiras têm de ser salarialmente dignificadas e suficientemente atractivas de forma a possibilitar a contratação e a manutenção no corpo docente dos mais capazes, com os mais elevados níveis de dedicação à consecução dos objectivos das respectivas instituições.

 

2. O actual ECDU: Resultados da sua aplicação

O actual Estatuto de Carreira Docente Universitária (ECDU), aprovado pela Assembleia da República em 1980, representou, naquele momento, um extraordinário avanço na direcção destes desideratos. São de salientar:

·        a criação do regime de dedicação exclusiva, que veio corresponder a um acréscimo salarial de 50% relativamente ao simples tempo integral;

·        as garantias de manutenção na carreira aos docentes em formação, apenas dependente de aprovação no mestrado, ou nas provas de aptidão pedagógica e capacidade científica, e no doutoramento;

·        a consagração do direito dos assistentes a uma dispensa de serviço docente de 3 anos, para a obtenção do doutoramento;

·        a garantia de emprego assegurado na função pública para os assistentes que não obtivessem o doutoramento, nos prazos estipulados, e para os professores que vissem recusada a nomeação definitiva na carreira.

 

Estas medidas, muito positivas, permitiram:

·        uma rápida qualificação dos docentes universitários, num ambiente bastante aberto, em grande medida respeitador das liberdades académicas, que só a tardia expansão do sistema, não acompanhada das medidas necessárias, verificada a partir do final da década de 80, impediu que pudesse ser hoje bem mais significativa;

·        um aumento extraordinário dos níveis dedicação dos docentes às respectivas instituições;

·        um forte acréscimo da actividade de investigação.

 

A equiparação salarial à magistratura, aprovada pela Assembleia da República em 1987, com a introdução de um sistema de acréscimos salariais significativos, de acordo com a antiguidade, veio, posteriormente, contribuir para uma maior dignificação da carreira.

Em contrapartida, a eliminação, por decreto-lei, da segurança de emprego na função pública, em 1985, para os assistentes, e em 1988, para os professores; a perda de equiparação à magistratura, verificada em 1989, apenas mitigada pela recente revalorização salarial, e a saturação dos quadros de professores, nas instituições mais antigas, na ausência de efectivos incentivos à mobilidade e perante o uso e abuso de arbitrariedades no funcionamento de muitos júris, vieram contribuir para:

·        a desmotivação de muitos professores associados e auxiliares que viram impossibilitada a sua promoção às categorias superiores;

·        a reduzida mobilidade dos professores entre instituições, apesar das limitações administrativas impostas às promoções nas instituições mais antigas;

·        o crescimento das dificuldades em obter o concurso dos melhores em certas áreas tecnológicas em que o mercado de emprego é muito competitivo;

·        a redução da dedicação de muitos docentes que se viram tentados a aceitar acumular serviço docente em instituições do ensino superior particular ou cooperativo, dispersando assim as suas atenções;

·        o aumento da precariedade da carreira com o correspondente acréscimo das situações de dependência e de limitação das liberdades académicas, incluindo as liberdades de expressão e de participação na gestão democrática.

·        Entretanto, a Autonomia Universitária, conquistada em 1988, através de lei da Assembleia da República, veio a ser fortemente condicionada pelas continuadas  restrições orçamentais, mais tarde associadas à fixação de rácios de gestão, a que muitas instituições se adaptaram mal, ou não se adaptaram ainda, e a uma fórmula de financiamento, nunca cumprida, o que conduziu, em muitos casos:

·        à substituição (ilegal) de assistentes de carreira por monitores ou por bolseiros de pós-graduação;

·        à atribuição de horas lectivas a docentes, para além do máximo estabelecido no ECDU;

·        à recusa da concessão a muitos assistentes do direito à dispensa de serviço docente para doutoramento;

·        ao preocupante envelhecimento dos corpos docentes nas instituições mais antigas.

O aumento significativo, verificado desde 1995, das verbas para bolsas, projectos e unidades de investigação, e a avaliação periódica destas por equipas estrangeiras, teve o efeito positivo de tornar mais intensa e competitiva a actividade de investigação, na sua grande maioria executada, no nosso país, em universidades ou em instituições a elas associadas, com base no trabalho desenvolvido por docentes e bolseiros, atendendo ao reduzido número de investigadores de carreira, e numa situação de enorme carência de pessoal técnico e auxiliar de investigação.

Esta evolução favorável da actividade de investigação, essencial a um ensino relevante e de qualidade, não foi, porém, acompanhada de uma evolução de igual qualidade e intensidade na actividade de ensino, que permitisse a esta tirar todo o partido daquela.

De facto, o Ministério da Educação (ME) tem mantido as instituições fortemente descapitalizadas, limitando-lhes assim as possibilidades de, através de um apoio específico à actividade de ensino, contrabalançarem a exigente actividade de investigação que inclui a apresentação de múltiplas propostas de projectos de investigação, a gestão e a execução daqueles que são aprovados pelo MCT, ou por Bruxelas, a publicação dos respectivos resultados em revistas internacionais de referência e a elaboração de relatórios destinados à avaliação e ao financiamento de projectos e de unidades de investigação.

Contrabalançar esta exigência, à qual se acrescenta a resultante da extensão universitária (contratação com empresas, consultadoria, etc.), essencial para a obtenção de financiamentos alternativos e também a um ensino relevante e de qualidade, implicaria tornar a actividade de ensino tão intensa e competitiva como as de investigação e de contratação com o exterior, pela atribuição dos meios materiais e humanos necessários, para o ensino e para a investigação, permitindo, assim, aumentar a disponibilidade, para a actividade de ensino, dos docentes mais qualificados. No entanto, caricaturando, o ME quase se limita a pagar os salários daqueles que fazem investigação financiada pelo MCT e pela UE.

Esta situação, que tem prejudicado os estudantes e os docentes mais interessados nas actividades de ensino, tem dificultado o combate ao insucesso e ao abandono escolares, que cresceram na proporção da explosão escolar da última década, e tem levado a que:

·        as actividades de ensino sejam pouco valorizadas nas avaliações integradas em concursos para lugares do quadro e em processos de nomeação definitiva de professores;

·        os docentes mais empenhados na actividade de ensino se desmotivem por não serem recompensados, nem apoiados, nos seus esforços, vendo-se sistematicamente preteridos nos concursos;

·        as acções de formação pedagógica sejam iniciativas pontuais e envolvam um número muito reduzido de docentes, em contraste com a quase obrigatoriedade do mestrado e a imprescindibilidade do doutoramento;

 

3. O anteprojecto de ECDU: Críticas e soluções

O anteprojecto de ECDU, agora apresentado pelo Governo, não sendo, evidentemente e como já se referiu, o único factor que pode influir positivamente na correcção dos problemas atrás identificados, tem de ser avaliado relativamente à contribuição, nessa direcção, que estaria ao seu alcance.

A principal alteração estruturante proposta no anteprojecto é a fixação da entrada na carreira na categoria de professor auxiliar, passando os assistentes a poderem ser contratados apenas, excepcionalmente, quando não haja concorrentes doutorados com o perfil exigido.

Trata-se de uma medida, em princípio, positiva, pois não é aceitável que, existindo doutorados em condições de serem admitidos, se continue a optar pela contratação de licenciados ou de mestres (o actual ECDU não prevê concursos para professor auxiliar), desprezando o esforço entretanto feito pelo Estado na atribuição de bolsas de doutoramento e dificultando, a pessoas com formação avançada, a obtenção de um emprego que corresponda a esse nível elevado de habilitações.

Contudo, nada justifica que, aos novos assistentes, até porque serão contratados por não existirem doutorados na área pretendida - situação que justificaria a atitude oposta -, seja atribuído um regime de trabalho sem os direitos reconhecidos aos actuais assistentes, isto é, sem a possibilidade de opção pelo regime de dedicação exclusiva (num claro convite à acumulação), sem o direito a dispensa de serviço docente para doutoramento, com um tempo máximo de contratação mais curto (sem direito à prorrogação extraordinária do contrato por um biénio), e sem o direito a recusarem prestar serviço docente em mais do que uma disciplina, simultaneamente.

O assistente é assim encarado, no anteprojecto, como um docente descartável, enquanto um bolseiro, sem tarefas de ensino, se doutora para assumir posteriormente o seu lugar na carreira. Deste modo, é legitimo que se duvide da qualidade e do empenhamento daqueles que viessem a aceitar tais condições, com os reflexos negativos que a situação teria na qualidade do ensino.

Também não se justifica a manutenção dos professores auxiliares fora do quadro, uma vez que representam, neste momento, uma fracção muito significativa dos docentes com doutoramento - grau de referência agora proposto para o ingresso na carreira, através de concurso - e dado que um grande número desses professores já tem nomeação definitiva (situação que, ocorrendo fora do quadro, constitui uma singularidade na administração pública).

Relativamente a medidas mais pontuais, são positivas e correspondem a reclamações da FENPROF e da PRC:

·        a garantia de compensação de cargas lectivas, para além do máximo semanal fixado;

·        a previsão de um novo período de nomeação provisória para os professores auxiliares que vejam a sua nomeação definitiva recusada, uma primeira vez, e a clara definição de quem tem direito a votar nos processos de nomeação definitiva;

·         a exigência de publicitação dos critérios de avaliação nos concursos; a obrigatoriedade expressa de levar em consideração as actividades de ensino, de investigação, de gestão, de extensão e, mesmo, as de carácter profissional; e a tentativa de reduzir factores de falta de transparência no funcionamento dos júris, embora materializada numa solução claramente inexequível, com base em concursos de provas públicas, a realizar numa situação de quadros quase completamente preenchidos e com a previsão de muitos candidatos).

E ficam por aqui as escassas virtudes que se reconhecem ao anteprojecto. Assim, globalmente esta proposta não corresponde às necessidades atrás apresentadas.

 

3.1 Estímulos à valorização profissional e progressão na carreira

Na realidade, no que respeita à questão central de qualquer carreira - os estímulos a uma permanente valorização profissional - nada surge de positivo. Muito pelo contrário.

De facto, numa situação de bloqueio de carreiras nas maiores instituições e em determinados domínios científicos, não só nada é proposto que incentive o mérito e a valorização pessoal na carreira, como é abolida a agregação, única prova de mérito absoluto após o doutoramento, sem a apresentação de qualquer outra alternativa que seja exclusivamente dependente de uma avaliação de mérito.

Deduz-se que esta medida de abolição da agregação, sem alternativa, conjuntamente com a de obrigar os júris dos concursos a disporem de uma maioria de membros exteriores à unidade orgânica (escola) a que respeitem - alegadamente para combate ao "caseirismo" - e, ainda, com a de impedir o recrutamento de licenciados e dificultar o de mestres, para as categorias de docentes em formação, seja destinada a aumentar os factores de mobilidade e a reduzir os que favoreçam a "endogamia", pela negativa, isto é, pela negação do acesso a provas internas - a agregação -, o que agravaria o mal estar resultante da negação de oportunidades suficientes de promoção na própria instituição e "motivaria" mais os docentes a procurar concorrer a lugares exteriores à instituição, e pela negação da autonomia de escolha, por parte das escolas, do sistema de formação cientifica e pedagógica que preferem para os docentes que pretendem admitir (algumas continuam a preferir que tal formação se faça em exercício, a partir de assistente estagiário ou de assistente).

No que se refere à mobilidade que pretende favorecer, em lugar de criar incentivos, pela positiva (oferta de subsídios à fixação e de melhores condições de trabalho), para que toda uma nova geração de jovens doutorados, em início de carreira, e para que outros professores já mais experientes, se sintam motivados a ocuparem lugares fora dos grandes centros onde as universidades têm os quadros saturados, o ME, pelo contrário, espera que os docentes com carreiras bloqueadas se "fartem" de aguardar pela jubilação dos mais antigos e prefiram mudar para vagas em outras cidades - mecanismo que, comprovadamente, ao longo de pelo menos 10 anos, claramente não funcionou a favor de qualquer mobilidade, com algumas escassas excepções.

Por outro lado, mantém-se nos concursos para lugares de quadro a sobreposição de procedimentos para a admissão de um novo professor e para a promoção dos já existentes no estabelecimento, com os efeitos que tal implica na restrição à autonomia das instituições, que seria acentuada pela maioria externa dos membros dos júris, para aplicar uma política própria de gestão dos respectivos corpos docentes, fixada nos planos de desenvolvimento (uma escola pode ver-se obrigada a aumentar o seu número de docentes, sem que tal tenha resultado de uma decisão dos seus órgãos) e na deterioração do ambiente relacional interno, que o reduzido número de vagas tem agravado, devido à competição que isso implica e que se reflecte no número de concursos que têm sido contestados e anulados em tribunal.

Ao negar-se o reconhecimento das qualificações e a passagem à categoria que lhes corresponde, devido à inexistência de vagas, nega-se simultaneamente o acesso à autonomia profissional para o exercício de funções mais elevadas, com evidente prejuízo para a eficácia no cumprimento das missões da universidade. Ao mesmo tempo que se recusa o legitimo direito à promoção, descrevem-se as funções dos professores de tal modo que um professor auxiliar é considerado à altura de substituir um professor catedrático, sem qualquer reconhecimento ou recompensa.

A solução que a FENPROF propõe está na consagração de quadros globais que permitam a promoção, através de provas de mérito absoluto, sem necessidade de vagas, com condicionalismos de acesso a essas provas, designadamente de carácter temporal, sendo a admissão de novos docentes feita sempre através de concurso. Outros mecanismos poderiam ser encarados, fora das promoções, com vista ao reconhecimento e à retribuição do mérito, como por exemplo a inclusão de mais escalões remuneratórios em cada categoria, de acesso condicionado a uma avaliação de mérito, mas nunca como forma de substituir a necessária criação de oportunidades suficientes de promoção.

 

3.2 Júris dos concursos: Idoneidade e independência.

O combate à falta de transparência e de equidade e às arbitrariedades, que resultam de os concursos estarem, na prática e não por razões legais, muito sujeitos a influências de lobbies, a caseirismos e a pressões para a criação de estereótipos do bom professor, pela imposição de critérios baseados quase exclusivamente na actividade de investigação, procura fazer-se, desastradamente, por um mecanismo fundamentalista de provas públicas, inexequível, que transformaria avaliadores e avaliados em autênticos caixeiros viajantes, repetindo provas e avaliações, um pouco por todo o país. Este tipo de provas públicas só faz sentido no contexto dos quadros globais que a FENPROF propõe.

Consciente desta dificuldade e na ânsia de tornar esta proposta aceitável, o ME cede, contraditória e inaceitavelmente, à tentação de alargar consideravelmente o universo de escolha de membros para os júris.

Assim, não hesita em pôr em causa a idoneidade destes ao permitir que professores de fora da área científica, ou de área afim, à qual corresponde o concurso, possam pertencer aos júris, e, até, que nestes possam participar outros profissionais que não são docentes do ensino superior; e permite mesmo que os júris possam deliberar com a presença de uma maioria de membros de fora da área ou de área afim, como se pode verificar por simples exemplos de aplicação das regras propostas para o seu funcionamento.

Também não hesita em pôr em causa a independência de decisão de membros dos júris, ao admitir a participação nestes, sem restrições, de professores com categoria igual à dos lugares a prover, que, com grande probabilidade, serão avaliados por pares seus nesses júris, quando forem candidatos em futuros concursos para promoção à categoria superior.

Recorre, ainda, à medida muito controversa de permitir a inclusão de professores jubilados e aposentados nos júris.

 

3.3 Formação pedagógica e valorização das actividades de ensino

O anteprojecto apresenta, entretanto, uma visão redutora das exigências da actividade de ensino, quando esta é encarada de modo profissional. Parece satisfazer-se com uma lição para avaliar as qualidades pedagógicas, como se as competências nesse campo se resumissem à demonstração de capacidades de organização de uma aula e da sua exposição clara e compreensível para uma audiência (caso da prova prevista para professor auxiliar).

As actividades de ensino estão deficientemente caracterizadas e continuam desvalorizadas. A importância de aquisição de formação pedagógica é completamente ignorada, o que é tanto mais grave quanto o ME pretende que se passe a recrutar novos docentes ao nível de professor auxiliar, sem que tenham adquirido a experiência pedagógica daqueles que fizeram todo o percurso desde a categoria de assistente estagiário. Se bem que seja exigida a definição dos critérios de avaliação nos concursos, o que a lei geral já impunha, não são estabelecidas proporções mínimas para as diversas actividades a avaliar, designadamente as de ensino e de investigação, com vista à seriação final dos candidatos.

O aumento da disponibilidade dos docentes para as actividades do ensino, indispensável, no entender da FENPROF, à urgente promoção do sucesso escolar e da qualidade do ensino, terá que passar, também, pelo aumento significativo dos efectivos da carreira de investigação nas universidades ou, em alternativa, por idêntico aumento no número de docentes, através da modificação dos rácios, que permita às instituições ter o número necessário de docentes dedicados exclusivamente à investigação por períodos de um ou mais anos, de acordo com a programação daquela actividade, dando assim oportunidade a que os docentes mais qualificados tenham tempo para se dedicarem mais ao ensino, fazendo com que esta actividade beneficie, com maior eficácia, da investigação praticada.

 

3.4 Dedicação Exclusiva pela positiva.

A pretexto de que o regime de dedicação exclusiva é definido pela negativa, é exigida, no anteprojecto, para a entrada neste regime, a entrega de planos de actividade de natureza exclusivamente científica e que pressupõem a apresentação de relatórios que, a serem avaliados negativamente, poderão conduzir a uma recusa da permanência naquele regime. Esta proposta, para além de acrescentar, aos já existentes, mais um factor potencialmente gerador de situações de dependência e de conflito, introduz um sistema pesado e muito burocrático de planos, relatórios e avaliações, paralelo aos procedimentos de avaliação quinquenal, também previstos no anteprojecto para todos os docentes de carreira.

Ora, a opção pela dedicação exclusiva, que cabe a cada docente individualmente, longe de significar uma atitude "pela negativa", representa uma decisão claramente pela positiva de quem assume o compromisso positivo de se dedicar, no plano laboral, exclusivamente à prossecução dos objectivos incluídos nos planos de actividade e de desenvolvimento das respectivas instituições. Foi, assim, muito positivo que, em 1987, tivesse sido substituído o subsídio de dedicação exclusiva, medida inicial que veio permitir um salto qualitativo no desenvolvimento do ensino superior, pelo regime de dedicação exclusiva, considerado como a situação normal de prestação de serviço dos docentes de carreira, e tomado como referência para a fixação das remunerações de todos os docentes, designadamente dos que se encontram apenas em regime de tempo integral.

Assim, para a FENPROF, não é aceitável que se recue aos tempos do subsídio de dedicação exclusiva. No âmbito das instituições, os órgãos de gestão terão de integrar, como devia ser normal, todos os docentes e, muito em especial, aqueles que optaram pela dedicação exclusiva, nos projectos e programas de trabalho previstos nos planos de actividade e de desenvolvimento aprovados democraticamente, em vez da ideia de "cada um por si" que resulta das propostas do anteprojecto. A FENPROF admite a institucionalização de estímulos, positivos, para o aumento da "produtividade" de todos e de cada um dos docentes. Erguer a iníqua ameaça de uma redução salarial de 1/3 do vencimento, seria mais uma originalidade, no âmbito da função pública e no direito geral do trabalho, de muito duvidosa legalidade.

 

3.5 Segurança de emprego e comunicabilidade entre carreiras.

Com a excepção da alteração relativa à nova oportunidade dada aos professores auxiliares para a obtenção da nomeação definitiva, a precariedade de emprego mantém-se, ou reforça-se, se recordarmos que os novos assistentes ficam muito mais ameaçados pelo desemprego e, logo, mais sujeitos a arbitrariedades que os actuais, devido aos novos obstáculos colocados à obtenção do seu doutoramento.

No entender da FENPROF, é urgente que sejam repostos procedimentos, com vista à reconversão profissional, para outras carreiras da função pública, destinados aos assistentes que não obtenham o doutoramento e aos professores auxiliares que não vejam aprovada a sua nomeação definitiva. A FENPROF propõe que seja criado um mecanismo que responsabilize, em primeira instância, as instituições, por integrarem nos seus quadros de pessoal não-docente aqueles a quem decida não reconhecer as capacidades consideradas necessárias à docência no ensino superior, desde que tenham estado ao seu serviço mais do que 3 anos.

A FENPROF considera que é ainda necessário prever mecanismos de comunicabilidade, em ambos os sentidos, entre as carreiras do ensino superior, por um lado, e as carreiras da investigação, do ensino não-superior e também as técnicas superiores, por outro, sem perda de direitos adquiridos em qualquer delas.

 

4. Conclusão

Os objectivos do Governo ao apresentar este anteprojecto foram os de:

·        exigir, nas situações normais, o doutoramento para o acesso à carreira, procurando, assim, garantir o emprego aos bolseiros doutorados pelo PRAXIS, sem assegurar a necessária preparação pedagógica destes, após a sua inserção na carreira, e sem garantir as imprescindíveis condições de trabalho e de formação aos assistentes que viesse ainda ser necessário contratar;

·        manter, ou mesmo, agravar, pela eliminação da prova de agregação, os factores de promoção da mobilidade pela negativa, obrigando os docentes das instituições com os quadros preenchidos a concorrer a concursos externos caso pretendam ver as suas qualificações e o seu desempenho reconhecidos e premiados;

·        "responsabilizar" mais os docentes em dedicação exclusiva, pela negativa, ameaçando-os com um corte de 1/3 nos seus vencimentos, sem responsabilizar as instituições;

·        tornar os concursos mais "transparentes", através de medidas relativas à constituição e ao funcionamento dos júris e pela transformação das provas documentais em públicas, num sistema concebido de forma precipitada e irrealista, que conduziria a universidade a uma quase paralisia e aos graves riscos de falta de idoneidade e de independência dos júris;

·        evitar investir mais recursos na carreira docente universitária e, até, reduzi-los, pelos expedientes a seguir descritos.

 

Na realidade, quanto a este último e não explicitado objectivo, no que se refere aos meios indispensáveis à construção de uma carreira mais eficaz, o ME, ao invés de propor melhores vencimentos para os que se apresentem mais qualificados e demonstrem melhores desempenhos e maior dedicação, pretende realizar reduções orçamentais através da montagem de um sistema de recusa de manutenção em regime de dedicação exclusiva, com efeitos fortemente penalizantes em termos salariais, absolutamente despropositado e de consequências potencialmente perigosas para um saudável ambiente de trabalho que valorize a cooperação nas instituições.

Para além disto, no que respeita a "economias", o anteprojecto, impede que os novos assistentes possam exercer funções em regime de dedicação exclusiva e prevê que os leitores e os docentes convidados não possam, igualmente, ter acesso a esse regime, sem a consagração de nenhum regime transitório para a sua passagem à carreira e sem a garantia dos direitos adquiridos, situação inaceitável por ameaçar, com o corte de 1/3 do vencimento, aqueles que, de há muitos anos (alguns até à beira da reforma), por uma razão ou por outra, têm prestado serviço no regime de dedicação exclusiva.

Acresce a este panorama economicista a recusa do ME em aceitar a validade actual do acordo, assinado em 1996, com os sindicatos, que garante que o vencimento de ingresso nas carreiras docentes do ensino superior, como assistente estagiário ou como assistente do 1º triénio, nunca será inferior ao correspondente à entrada, com licenciatura e sem profissionalização, na carreira do ensino não-superior, no mesmo regime de prestação de serviços. Deste modo, as carreiras docentes do ensino superior já se encontram desvalorizadas 3,3%, desde 1/7/00, e ficarão mais desvalorizadas ainda, 1,7%, a partir de 1/10/01, correspondendo a um total de 5%, exactamente a diferença percentual que a partir desse dia a entrada na carreira do não-superior ficará acima da do superior.

Por todas estas razões, a FENPROF rejeita esta proposta de novo ECDU e apenas aceitará negociar um projecto que atenda às críticas atrás apresentadas e que vá ao encontro das suas principais reivindicações:

·        desbloqueamento das carreiras, de acordo com um mecanismo que permita as promoções por mérito absoluto (não dependentes da existência de vagas, como actualmente), com a criação de quadros de dotação global e separando as oportunidades de promoção dos processos de acesso à carreira;

·        redução da precariedade da carreira, através da aprovação de mecanismos de reconversão profissional, na função pública, a aplicar aos docentes que se vejam impedidos de prosseguir nesta carreira, após um mínimo de 3 anos de serviço;

·        recusa de que a regulação do regime de dedicação exclusiva se converta numa forma encapotada de redução de direitos adquiridos em termos salariais pelos docentes;

·        manutenção das garantias laborais e dos direitos de formação dos assistentes.

11/5/2001

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