A nova proposta do ME e a falta de Democracia

Reunião do dia 20 no Ministério da Educação

O ME apresentou uma «contra-proposta». As alterações que apresenta não têm nenhum significado prático. É como se em vez de deitar oito colheres de mostarda, em dois ou três cozinhados, disse-se que só iria deitar sete colheres e meia, isto em troca de os sindicatos estabelecerem a paz e colaborarem com o ministério convencendo os professores que a proposta é o melhor que há. 

Os sindicatos não podem estar de acordo, se estivessem, seria uma desonestidade intelectual, profissional e moral. Nós sabemos que a proposta do ministério proletariza e empobrece a profissão e é péssima para a educação. Com ela o sistema educativo português  ? que precisa com urgência de ser pensado para a nova sociedade ? transformar-se-á num caos burocrático onde ensinar e aprender vai ser um acessório e não o centro de toda a actividade. 

A proposta mostra claramente a arrogância, o autoritarismo, o autismo, o desconhecimento do dia a dia dos professores e das reais necessidades existentes nas escolas, por parte da equipa que governa actualmente a educação nacional. Para que todos pensem por si, segue em anexo a esta nota. 

Que a carreira docente e a organização das escolas precisam de ser alteradas ninguém duvida. Que pensar e avaliar o trabalho docente é uma necessidade intrínseca à profissão, ninguém põe em causa. O que está em causa é a diferença quanto ao que se deve fazer. Para nós, as medidas propostas pelo ME têm como consequência inevitável piorar tudo, a carreira, a vida pessoal e profissional dos professores e educadores, o funcionamento das escolas e, sobretudo, as condições de ensino e de aprendizagem dos alunos.  

Se estas medidas do ministério forem por diante as escolas que já são hoje um sitio onde é difícil trabalhar, transformar-se-ão em monstros burocráticos capazes de devorar todos os que lá entram, sejam professores, sejam alunos. 

O que está particularmente em causa na proposta do ME é a sua lógica interna.

A proposta tem uma lógica desadequada às actuais obrigações e necessidades do ensino. Faz uma proposta de carreira como se estivessem a pensar num corpo profissional de uma fábrica têxtil, de calçado ou metalúrgica, em funções antes da 2ª Guerra Mundial. Ora a sociedade industrial em Portugal está no seu termo (vejam-se as deslocalizações de empresas de mão-de-obra intensiva). O que temos em desenvolvimento é a sociedade do conhecimento. Exige uma outra escola. Formas novas de organização interna. Novos modelos de organização do trabalho dos professores. O trabalho individual tem de ser substituído pelo trabalho de equipas multidisciplinares. Como conciliar estas novas exigências com uma proposta que privilegia a avaliação centrada sobre o indivíduo e não na equipa e no trabalho por esta produzido? 

Provavelmente os sindicatos terão de romper com toda e qualquer negociação com a actual equipa do Ministério da Educação. Mas temos todos muito que fazer. E nesse muito que fazer, para alem da não aplicação das medidas do ME, está a urgência de desenvolvermos a nossa própria proposta de modelo de organização da escola e da profissão. Uma proposta que respeite os alunos que temos e os professores que somos, e que nos torne a todos, alunos e professores, mais produtivos e mais felizes.

Dúvidas

Quando o ME diz que o actual estatuto permitia a muitos professores chegar ao topo da carreira sem dar aulas a quem se está a referir? 

·     Aos 7 ou 8 mil professores que ocupam os gabinetes do ministério a nível central e regional? Como vão avaliá-los no futuro? Quem faz de pai? O que faz de notas dos alunos? Como lhes aplicarão a taxa de abandono escolar? Terão em conta as faltas? E os tempos de conversa serão descontados?  Como avaliarão o ?vou ali, volto já?? Ou será que estão a pensar dispensá-los de tudo? Um bico-de-obra para deslindar.

·     Aos milhares de autarcas-professores,  assessores, consultores e outros técnicos das autarquias? A maioria deles não dá aulas. A sociedade não precisa deles? Como vão progredir? Outro bico-de-obra para deslindar.

·     Aos professores-deputados e professores dos gabinetes dos deputados? Não são precisos? Têm de optar entre o 7º escalão para sempre e a representação da nação? Também não dão aulas. Como vão progredir? Outro bico-de-obra para deslindar.

·     Aos professores que asseguram o funcionamento das associações desportivas e outras associações sociais e culturais ou vários serviços educativos  nos mais variados ministérios? Muitos não dão aulas. Como vão progredir? Outro bico-de-obra para deslindar.

Podemos enumerar outros grupos de professores.

Será que quando a ministra se escandaliza por haver professores que progridem sem dar todas as aulas é nestes que está a pensar?

Ou está a pensar nos que estão na escola para os quais parece estar a fazer a proposta? 

Os que estão na escola progridem até ao topo sem dar aulas?!

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