EI — Missão impossível ou impossibilitada?

3 de novembro de 2022

A Fenprof realizou uma conferência de imprensa sobre a Educação Inclusiva (EI) onde divulgou as conclusões de um levantamento efetuado junto das direções dos Agrupamentos de Escolas (AE) e Escolas Não Agrupadas (ENA), ao longo das duas primeiras semanas de abertura do presente ano letivo. O objetivo deste levantamento foi o de verificar se as medidas aprovadas pelo governo estavam a dar resposta às necessidades dos alunos. A conferência de imprensa contou com a presença do secretário-geral da Fenprof, dos representantes da Associação Portuguesa de Deficientes (APD) e da Confederação Nacional de Organizações de Pessoas com Deficiência (CNOD), que deixaram os seus contributos.

Ana Simões (coordenadora do departamento da Educação Especial da Fenprof)

Apesar de não ser um levantamento específico sobre a EI, mas sobre as condições de abertura do ano letivo, a maioria dos AE referiu a falta de recursos para a concretização de uma efetiva Educação Inclusiva e, também, para a existência de uma adequada resposta da Educação Especial (EE), não obstante o reconhecido esforço dos docentes nesse sentido.

Segundo as direções dos AE e ENA, coincidindo, nestes aspetos, com os relatos que chegam aos Sindicatos que constituem a Fenprof dos docentes, faltam professores de EE, faltam assistentes operacionais nas escolas, mesmo naquelas que cumprem um rácio reconhecidamente insuficiente, o que se reflete no apoio aos alunos com necessidades especiais, ou melhor, na falta do apoio que se exigia; também faltam psicólogos, terapeutas, entre outros recursos.

Neste quadro de poupança no que é essencial e com um Orçamento do Estado para 2023 (OE/2023) que prevê uma redução de quase 600 milhões de euros – quando a Educação, em Portugal, necessitava de quase 2000 milhões para chegar à média dos países da OCDE –, como pode o governo, em particular o ministro da Educação, João Costa, não ter uma visão crítica (e realista) em relação ao que se passa com a Educação Inclusiva? Será, apenas, por ser o principal responsável pelo atual quadro legal e pela forma precipitada como ele foi implementado, tanta era a pressa de alterar o paradigma de EE para o da EI? E porquê tanta pressa, quando, mandava o bom senso, tornava-se necessário experimentar, avaliar e só depois generalizar? Tratar-se-ia de uma necessidade sentida no plano pedagógico ou de uma antecipação ao processo de municipalização, no sentido de transferir para os municípios problemas como a organização de transportes, a colocação de assistentes operacionais e, mesmo, o financiamento?

Da falta de recursos

Uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, precisa dos recursos humanos necessários para acompanhar e apoiar todos os alunos, de acordo com as dificuldades que apresentem, sejam elas de caráter permanente ou temporário.

  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, com falta de docentes de EE, sobrecarregando os que já estão colocados, havendo quem tenha de dar apoio a mais de 20 alunos por semana?
  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, com falta de docentes profissionalizados, com as escolas a terem de atribuir turmas que incluem alunos com necessidades específicas, algumas de elevada complexidade a quem não tem a indispensável formação pedagógica?
  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, com turmas com 25 ou mais alunos, no 1.º CEB, por vezes, com diversos anos de escolaridade, nas quais são integrados três, quatro ou cinco alunos com necessidades especiais comprovadas?
  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, quando, apesar de cumprido o rácio de colocação dos assistentes operacionais, não há assistentes operacionais para permanecerem de forma contínua com o aluno com necessidades especiais dentro ou fora da sala de aula?
  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, quando há alunos que ficam em casa após o início do ano letivo, porque há desentendimentos entre municípios quanto aos transportes, sobre quem deverá assumir a despesa de deslocação, quando a residência e a escola são em concelhos diferentes?
  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, quando, por exemplo, o Ministério da Educação não acolhe a solicitação de um terapeuta da fala, por parte de um AE no qual existem alunos que precisam desse apoio?
  • Como é possível uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade, quando determinado terapeuta se encontra em licença parental e não é autorizada a sua substituição?

Do desrespeito pelos horários dos docentes de EE

Há horários dos docentes de EE que, na sua organização, não distinguem as diferentes componentes e, por isso, não respeitam o que deve estar integrado na componente letiva, na componente não letiva de estabelecimento e na redução de componente letiva prevista no artigo 79.º do Estatuto da Carreira Docente (ECD: Redução de horas letivas pela idade e tempo de serviço).

O docente da EE, na sua componente letiva, assegura apoios individualizados a alunos, desempenhando exatamente a mesma atividade na sua componente de estabelecimento e na referida redução da componente letiva (artigo 79.º do ECD), o que, mais do que um abuso, constitui um grosseiro desrespeito pela lei.

Esta forma de organização do horário do docente de EE leva a que seja ultrapassado, em muito, o número de horas que a legislação prevê para o exercício de atividade direta com os alunos. Não é com a sobrecarga de trabalho dos docentes colocados nas escolas que se colmata a falta de recursos na EE.

Outro problema é o da não coincidência de horas entre o horário do docente da EE e o do ensino regular para a fundamental articulação do trabalho a desenvolver com os alunos na sala de aula, não sendo possível um trabalho e um ensino com a qualidade que se desejaria. Muitas vezes essa articulação é feita por escrito ou com o sacrifício de um deles, ou dos dois, em períodos para além do seu horário de trabalho.

Muitos horários que vão para a contratação são incompletos. Por esse motivo, são de difícil preenchimento. A solução para este problema passa pelo completamento de todos os horários incompletos, sem risco de não haver atividade a desenvolver, dada a escassez de recursos nas escolas e as muitas solicitações que nestas existem.

As colocações dos docentes da EE não são contabilizadas pelo número de horas de cada horário, mas pelo número de docentes. Um AE que tenha 4 docentes da EE com reduções de componente letiva ao abrigo do artigo 79.º (podendo corresponder a quatro horários de 16 e não de 22 horas) vê recusada, pelo Ministério da Educação, a colocação de mais docentes porque já tem o número considerado suficiente (segundo um critério que não tem existência legal) para o número de alunos.

Esta é a atual realidade da Educação Inclusiva e da Educação Especial nas nossas escolas.

A Fenprof acredita que a Educação Inclusiva é possível, e defende-a

Uma efetiva EI, com respostas adequadas e de qualidade não é missão impossível, mas está a ser dificultada por governo e ministério ao imporem políticas e medidas condicionadas pelo subfinanciamento da Educação. Tal, constitui um inaceitável desrespeito por alunos, famílias e profissionais da Educação


31 de novembro de 2022

Com a presença de representantes da Associação Portuguesa de Deficientes (APD) e da Confederação Nacional de Organizações de Pessoas com Deficiência (CNOD), a Fenprof irá promover uma


CONFERÊNCIA DE IMPRENSA

Sede da Fenprof, 3 de novembro — 11:00 horas

"Educação inclusiva: missão impossível ou impossibilitada?"


Desde o início do ano que a Fenprof tem acompanhado, nas escolas, as condições para o reforço das aprendizagens dos alunos que mais perderam com o ensino remoto de emergência. Com esse intuito, realizou um levantamento das condições, solicitou testemunhos, realizou reuniões com docentes, recebeu queixas e relatos...

Muitas têm sido as questões problematizadas: será a escola verdadeiramente inclusiva? A educação inclusiva, prevista na lei há quatro anos, será realidade? Com que recursos (não) contam as escolas? Quais as condições nas escolas para os docentes de Educação Especial, bem como os titulares das turmas responderem às necessidades dos alunos e às expetativas das famílias?

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