Reflexões da FENPROF para um ensino de qualidade

Sindicato dos Professores do Norte / FENPROF

Reflexões da FENPROF para um Ensino de Qualidade

Concursos: de novo sob o signo da instabilidade

1.

         Coincide esta Conferência de Imprensa da FENPROF com a publicação do aviso de abertura dos concursos de colocação de professores e educadores para o ano lectivo de 2002/2003. Justifica-se, pois, que mais uma vez a FENPROF denuncie a situação criada a cerca de 6.000 professores contratados, cidadãos que criaram justificadas expectativas cimentadas em acordos assinados e em negociações transparentes, mas que viram as suas esperanças anuladas pela decisão política do governo de não publicar o que fora negociado, decisão eminentemente política para a qual a alegação de limitação de competências de um governo de gestão é uma mera máscara.

2. 

         Reger-se-á o concurso hoje ?aberto? por mecanismos datados da década de 80, suspendendo ou anulando o esforço desenvolvido durante meses para a consecução de uma nova filosofia e de novas regras que deveriam conduzir a uma maior estabilidade do corpo docente nas escolas.

         Uma nota de saliência para o facto deste concurso voltar a apresentar um elevadíssimo número de vagas negativas, ou seja, a fechar, o que significa uma reduzida perspectiva de entrada dos docentes nos quadros.

          Face à situação criada pela decisão do Governo demissionário, a FENPROF desenvolveu várias iniciativas procurando sensibilizar os partidos políticos com representação na AR para a necessidade de se fazer justiça relativamente aos professores contratados. Se por um lado o PCP, o BE e os Verdes sustentaram a posição da FENPROF, já o PSD e o PS manifestaram concordância com a atitude do Governo, ressalvando-se porém que enquanto o PSD se recusa a assumir qualquer compromisso futuro, o PS afirma que retomará este processo se vier a ser Governo, numa atitude cómoda de quem faz com facilidade promessas para o futuro e ignora as responsabilidades do presente. O PP ignorou a questão.

          A FENPROF regista ainda o apoio que as suas posições sobre esta matéria mereceram de estruturas tão diferentes como a CONFAP e a CGTP-IN.

          No que respeita ainda a questões de estabilidade profissional e de desrespeito pelos compromissos assumidos, a FENPROF denuncia a situação criada aos professores do ensino superior: o bloqueamento de quadros que impede as promoções em muitas instituições e que deve ser resolvido com a criação de quadros globais adequadamente dimensionados; a precariedade mantém muitos docentes, por exemplo, com contratos sob renovação de 2 em 2 anos e que os sujeita a despedimentos frequentemente ao fim de 15 a 20 anos de trabalho, sem direito a subsídio de desemprego; a desvalorização salarial de 5% resultante do não cumprimento do acordo salarial de 1995.

Opiniões (políticas) em época pré-campanha

3. 

O momento político actual, de plena pré-campanha eleitoral, provoca, legítima e saudavelmente, análises e debates sobre as grandes áreas da vida política e social. A Educação é, obviamente, uma dessas principais áreas. Neste contexto, a semana que ora finda fica assinalada por um conjunto de debates, ?estudos de opinião?, opiniões e comentários em torno das políticas educativas. Consciente do seu prestígio e de acordo com os seus princípios de intervenção em tudo o que à Educação diga respeito, a FENPROF respondeu a solicitações que lhe foram dirigidas pelos órgãos de comunicação social envolvidos. É chegado o momento de, num bosquejo de balanço, sublinhar os seguintes aspectos:

a) A FENPROF repudia as teses da ?direita?, por vezes, da ?extrema-direita? que consideram a Escola actual igual ou pior que a escola do período fascista. Tal ideologia esquece (combate?) o esforço e os resultados obtidos no que respeita à generalização do acesso dos jovens à escola, na expansão do pré-escolar e do ensino superior, na concretização da integração de crianças e jovens de necessidades educativas especiais no ensino regular, na melhoria generalizada dos conteúdos e das metodologias de ensino/aprendizagem, etc.

b) A FENPROF considera politicamente desonesto que os partidos que nos anos do regime democrático ocuparam o poder ? nomeadamente o Ministério da Educação (PSD durante 16 anos e PS nos últimos 6), e que legitimamente procuram colher os louros do que atrás se referiu como positivo, tentem ao mesmo tempo recusar as graves responsabilidades que lhes cabem nos fracassos, contradições e bloqueamentos que o diagnóstico feito nestes dias evidencia.

Entre as causas que conduziram à situação actual a FENPROF destaca a estranha política de promover reformas sobre reformas, sem permitir a consolidação e a avaliação das mudanças introduzidas, arquitectadas por equipas que rapidamente são substituídas e que logo se procuram distanciar dos resultados práticos a que os seus projectos conduziram.

A FENPROF, que desde logo alertou para o previsível fracasso da ?reforma? de Roberto Carneiro (1989/90), persiste em denunciar a irresponsabilidade de generalizar precipitadamente propostas que, mesmo sendo interessantes e defensáveis, exigem para o seu sucesso condições ainda inexistentes.

Sobre a reorganização do ensino secundário

Além do mais é difícil perceber como é que um governo que se considera limitado por um exercício de gestão, pode entender que tem condições para levar por diante o processo da generalização da revisão curricular do ensino secundário, quando é ainda necessário produzir um conjunto de diplomas legais para esse efeito, que pressupõem decisões políticas de fundo, destacando-se o novo despacho normativo sobre a avaliação dos alunos do ensino secundário, a portaria de reorganização dos grupos de docência face aos novos cursos introduzidos, para já não falar de outros diplomas complementares como o do acesso ao ensino superior,  o relativo aos apoios aos alunos com necessidades educativas especiais, o da definição do regime de permeabilidade para os alunos transitarem entre os cursos gerais e os cursos tecnológicos ou a regulamentação da questão da diversificação das ofertas curriculares.

Tomar decisões como aquelas que estão a ser levadas por diante, pelo M.E., relativamente ao encerramento de escolas secundárias, avançar propostas para a definição da nova rede de cursos gerais e tecnológicos susceptíveis de produzir profundas alterações no sistema educativo português (como, por exemplo, inverter as respectivas taxas de frequência dos alunos nos cursos gerais e nos cursos tecnológicos, por via administrativa) são actos próprios de qualquer governo no pleno exercício das suas funções, mas não por um mero governo demissionário e em gestão. Tais medidas de fundo implicam prévia discussão e negociação com os parceiros sociais.

Finalmente, avançar com novos programas sem um período prévio de experimentação, susceptível de verificar a adequação e extensão dos mesmos aos alunos do ensino secundário e a sua compatibilidade com um sistema de avaliação sumativa interna e externa, acrescido de provas globais, é pretender transformar no próximo ano os alunos do 10.º ano em cobaias da reforma educativa.

Não estão, pois, reunidas as condições mínimas para que se possa levar por diante, em Setembro próximo, a generalização ao 10.º ano da nova reforma curricular do secundário. A ponderação e o bom senso político apontam para a suspensão dessa generalização e a transformação do próximo ano lectivo num 10.º ano experimental, sendo o ano de 2003/2004 o ano da generalização a todas as escolas do 10.ª ano e do lançamento experimental do 11.º ano e, assim, sucessivamente, até à generalização completa a todo o ciclo de estudos.

Por outro lado a consolidação das inovações introduzidas no ensino básico exige, além de um balanço crítico dos resultados, um esforço sério para solucionar conflitos desnecessários e contraproducentes abertos pelo ME com os docentes, nomeadamente no que diz respeito ao seu horário lectivo.

c) Face aos dados divulgados durante esta semana (resultados das provas aferidas do 4º e 6º anos, mas também ?sondagens? à opinião publica), e aos resultados ?negativos? obtidos pelos estudantes portugueses no ?PISA?, também recentemente divulgados, alguns analistas insistiram em condenar os professores como os culpados pelos resultados obtidos. Por respeito para consigo próprios deveriam sublinhar o que os dados evidenciam. A saber:

- Que há fraquezas estruturais graves no nosso sistema educativo, nomeadamente no que respeita a equipamentos, condições de trabalho, definições curriculares e de programas (e a responsabilidade primeira será, obviamente, dos decisores políticos que têm governado o país e o Ministério da Educação ? PS e PSD).

- Que para os fracos resultados contribuem diversos e conjugados factores, à frente dos quais está a realidade económica, social e política de Portugal, incluindo aqui a ?juventude? da nossa democracia, nomeadamente no que respeita ao alargamento da base de acesso à escola.

- Que, no que respeita aos professores, é imperioso melhorar a sua formação inicial, rever os princípios e as práticas da formação contínua, e, conjugadamente, melhorar a sua imagem social. Neste contexto, a polémica sobre a avaliação dos professores é uma mera manobra de diversão. De facto, os professores já hoje são avaliados, devendo a FENPROF sublinhar que as suas propostas sobre a matéria, durante o processo da última revisão do Estatuto da Carreira Docente, eram menos burocráticas, e muito mais transparentes e com maior impacto na vida das escolas e, portanto, nas práticas pedagógicas, das que eram avançadas pelo Ministério da Educação.

d) A FENPROF rejeita liminarmente as teorias que sustentam que a melhoria do sistema educativo deveria assentar na diferenciação dos vencimentos dos professores (à margem do que hoje está legalmente estabelecido), diferenciação assente na avaliação de pretensas meritocracias.

Finalmente a FENPROF sublinha que são o esforço, a dedicação e a competência da esmagadora maioria dos professores e educadores que garantem o funcionamento do nosso sistema educativo face às enormes debilidades estruturais que o caracterizam. O que aliás é reconhecido pelos portugueses que, de acordo com estudos de opinião recentemente publicados em órgãos de informação, posicionam os professores entre as profissões com melhor imagem junto da população.

Debate público

4.

 Mas porque a FENPROF não se exime, antes potencia o debate e o confronto dos caminhos possíveis e necessários para a construção de uma escola pública de qualidade para todos, aqui se divulga que em 1 de Março próximo a FENPROF debaterá, publicamente, com os partidos políticos com assento na AR os caminhos futuros para a educação em Portugal.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2002

                                                                                                                    O Secretariado Nacional

Texto divulgado em conferência de Imprensa, 8 de Fevereiro de 2002, Lisboa. Presentes na Mesa: Paulo Sucena, Abel Macedo, Mário Nogueira, António Avelãs e Maria do Céu Figueiredo.



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