Educação pré-escolar — Governo promove sector privado!

09 de fevereiro de 2024

A propósito da expansão da rede da educação pré-escolar, passados 27 anos, o governo continua a desperdiçar a oferta pública e a promover o setor privado. Mais um exemplo foi a assinatura, entre o governo e o setor social e solidário, de um “Compromisso de Cooperação para 2023/2024" (17/dez/2023)

Na cláusula I – “Educação pré-escolar” –, na Área estratégia 5 (Educação e Segurança Social), é assumido que no planeamento e expansão da Rede Nacional da Educação Pré-escolar, o Ministério da Educação e o Ministério do Trabalho, Solidadriedade e Segurança Social se comprometem “a verificar a existência da capacidade instalada ou da possibilidade de alargamento na rede solidária antes da criação de novas salas na rede pública”.

A lei-quadro da educação pré-escolar (Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro), no artigo 5.º, é clara quando estabelece que incumbe ao Estado: “Criar uma rede pública de Educação Pré-Escolar, generalizando a oferta dos respetivos serviços de acordo com as necessidades.” Este artigo refere, igualmente, que o apoio do Estado à criação de estabelecimentos de educação pré-escolar por outras entidades da sociedade civil, só deve acontecer quando a oferta pública for insuficiente.

Passados 27 anos sobre a aprovação desta lei, os governos continuam a desrespeitá-la, o que leva a Fenprof a manifestar o seu veemente repúdio por essa opção política dos governantes. O que existe é a assinatura de um acordo que visa promover a designada rede solidária em detrimento da rede pública, contrariando a citada lei-quadro, assim como a Constituição da República Portuguesa (CRP).

É incompreensível que o Estado continue a desbaratar dinheiro em soluções que retiram às crianças a possibilidade de ingressarem em jardins-de-infância públicos gratuitos, onde está garantida a igualdade de oportunidades no acesso à educação pré-escolar, numa altura em que se encontra legislada e consolidada a universalidade da frequência para as crianças de 5 e 4 anos e aprovada em Assembleia da República para as de 3 anos e continue a desperdiçar recursos humanos e físicos enquanto financia as IPSS. Lamentavelmente, não exige a equiparação das condições de trabalho, vencimentos e carreira dos docentes e não docentes às que existem no setor público. Comparativamente com as condições daqueles, estas são péssimas, com abusos de toda a espécie e exploração da força de trabalho destes profissionais.

A CRP afirma que incumbe ao Estado criar um “sistema público e desenvolver o sistema geral da educação pré-escolar”. Com a publicação da lei-quadro da educação pré-escolar (1997), o Estado entendeu atribuir a outras entidades da dita sociedade civil um papel relevante na tão anunciada Expansão da Rede de Educação Pré-escolar, quando o quadro legal impunha outra opção.

Não batendo a bota com a perdigota, decidiu regulamentar a lei-quadro, aprovando o Decreto-lei n.º 147/97, de 11 de junho. Este diploma regulamentador veio perverter a lei-quadro ao inventar um novo conceito de rede para este setor de educação, o de Rede Nacional de Educação Pré-escolar, que, para além dos estabelecimentos públicos, passou a incluir os estabelecimentos particulares de solidariedade social e os do setor privado lucrativos, entre outros. Para estes ficavam previstas, ao abrigo deste decreto-Lei, linhas de crédito bonificado destinadas ao parque escolar. Assim, ao longo dos anos, os governos foram aprovando medidas de favorecimento às IPSS e ao setor lucrativo, onde também se incluem as creches (neste caso, recusando criar uma rede pública de creches), transformando a educação pré-escolar e também a valência “creche” num mercado apetecível.

A Fenprof exige que o Ministério da Educação avalie as reais necessidades a nível local, no que respeita à educação pré-escolar, sinalizando a oferta pública disponível, tanto ao nível de equipamentos, como recursos materiais e humanos, de forma a garantir que, na implementação da universalidade da educação pré-escolar, a oferta pública seja a primeira prioridade do Estado. 

 

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